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sábado, 18 de maio de 2013

Debaixo de algum céu

Autor: Nuno Camarneiro

Edição: 2013, Março
Páginas: 200
ISBN: 9789896602390
Editora: Leya

Sinopse:
Vencedor do Prémio LeYa 2012

Num prédio encostado à praia, homens, mulheres e crianças – vizinhos que se cruzam mas se desconhecem – andam à procura do que lhes falta: um pouco de paz, de música, de calor, de um deus que lhes sirva. Todas as janelas estão viradas para dentro e até o vento parece soprar em quem lá vive.

Há uma viúva sozinha com um gato, um homem que se esconde a inventar futuros, o bebé que testa os pais desavindos, o reformado que constrói loucuras na cave, uma família quase quase normal, um padre com uma doença de fé, o apartamento vazio cheio dos que o deixaram. O elevador sobe cansado, a menina chora e os canos estrebucham. É esse o som dos dias, porque não há maneira de o medo se fazer ouvir.
A semana em que decorre esta história é bruscamente interrompida por uma tempestade que deixa o prédio sem luz e suspende as vidas das personagens – como uma bolha no tempo que permite pensar, rever o passado, perdoar, reagir, ser também mais vizinho. Entre o fim de um ano e o começo de outro, tudo pode realmente acontecer - e, pelo meio, nasce Cristo e salva-se um homem.
Embora numa cidade de província, e à beira-mar, este prédio fica mesmo ao virar da esquina, talvez o habitemos e não o saibamos.
Com imagens de extraordinário fulgor a que o autor nos habituou com o seu anterior romance, Debaixo de Algum Céu - obra vencedora do Prémio LeYa em 2012 - retrata de forma límpida e comovente o purgatório que é a vida dos homens e a busca que cada um empreende pela redenção.

A minha opinião:
Para quem já leu alguns dos meus comentários sabe que fico reticente em ler autores portugueses. Não porque prefira romances leves e simpáticos em que tudo é cor-de-rosa (cor que nem aprecio) e todos acabam felizes e contentes numa irreal fição, mas porque gosto do possivelmente credível e coerente, com uma mistura de tudo, alegrias e tristezas, animo e dor, sucesso e perdição. Como a vida. 
Este romance maravilhoso que li e reli devido a uma escrita cuidada e fluída, que de tão bela nos impõe um olhar mais atento sobre as palavras e o seu sentido, deixou-me com uma sensação agridoce. Desencanto, desalento e solidão são reais e difíceis de ler porque encontram eco em muitas corações. Senão sempre mas em alguns momentos que parecem sempre demasiado  longos. O fado, que é tão bem português.
Citando:
"As palavras são difíceis mas são o que temos. O sofrimento é único para cada homem e para cada mulher, são infinitas as dores e poucas as palavras que lhes dão nome: desgosto, arrependimento, comiseração, tristeza, pesar, mágoa, pena, lástima, aflição, angústia, , nojo, desolação, comoção, choque, amargor. Faltam termos e sobram as horas más. Não falta descrever o que se pensa, porque não importa, o sofrimento corre abaixo da cabeça, no corpo que apanha, às voltas num mesmo lugar, como se chama o centro exacto de nós?"                                                        (pag. 73)
 
A sinopse é elucidativa, mas mais do que isso temos o prólogo do autor que assim começa:

"Uma história são pessoas num lugar por algum tempo. As margens da página, como o silêncio, estabelecem limites certos para que um conto não se confunda com o que não lhe pertence. Pode contar-se uma história enchendo uma caixa vazia ou desenhando paredes à volta de gente. 
Esta é uma história de portas adentro." 

Uma narrativa extraordinária mas um tanto amarga ou pragmática. Um talento inquestionável com as palavras que tão bem expressam emoções e sentimentos. Um compreensível vencedor do prémio Leya.

Recomendadissímo por quem cada vez duvida menos de que devemos ler autores portugueses e que os devemos ler baixinho  ou em voz alta para melhor interiorizarmos as suas palavras.

"O amor não é fácil em nenhuma idade e doí tanto ceder-lhe como fugir-lhe. Mas o amor é o que há, e eu estou velho para morrer sozinho."                                                                   (pag. 199)

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