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domingo, 29 de julho de 2012

As cores da amizade

Autor: Lisa Verge Higgins
Edição: 2012, maio
Páginas:  304
ISBN: 9789720043535
Editora: Porto Editora


Sinopse:
Rachel Braun sempre foi uma inspiração para o grupo de amigas, aquela que vivia a vida ao máximo. Antes de morrer, Rachel escreve uma carta para cada uma das três melhores amigas desafiando-as a enfrentarem os seus maiores medos.
Sarah, uma enfermeira da assistência internacional, terá de cruzar meio mundo até reencontrar o único homem que realmente amou. Kate, a dona de casa e mãe a tempo inteiro, terá de se confrontar com o medo das alturas; o skydiving será uma revelação para Kate em todos os sentidos. E Jo, a mulher da sólida carreira no mundo dos media, aquela para quem a maternidade não é tema de conversa, fica com a mais aterrorizadora das tarefas: cuidar da filha de Rachel, a pequena órfã Grace. Ainda mal acreditando no desaparecimento da amiga, as três mulheres percebem que o legado de Rachel vai permanecer nas suas vidas e que ela jamais morrerá nos seus corações.


A minha opinião:
Não correspondeu de todo ao que eu esperava e desejava. Faltou empatia com as personagens numa estória em que o ponto de partida para a reviravolta das suas vidas é a surpreendente perda da amiga louca e aventureira que endereça cartas com indicações que elas decidem acatar.

Faltou algo mais que eu me debato para descobrir, mas apesar da fluidez dos acontecimentos e algum drama, não consegui abstrair-me na leitura ou envolver-me e sentir como verossímil ou credível a estória. Mantive algum distanciamento de quem lê uma obra de ficção. (Talvez a falha seja minha porque trata-se de uma leitura de verão com várias interrupções e esta não seja a leitura ideal para estas circunstâncias).

Mas, voltando ao principal. 
Rachel, Kate, Sarah e Jo, conheceram-se num clube de montanhismo. Todas tinham razões distintas para aderir ao clube. A Kate - Mrs. Jansen era um verdadeiro ratinho de biblioteca que precisava de um pretexto para sair de casa. A Sarah, de Vermont e adora actividades ao ar livre. Jo, entrou devido a um engano na sala para onde se dirigia, mas todas precisavam de vez em quando, de trepar aos cumes das montanhas. Para ver as coisas sob um ângulo diferente.
Quatro mulheres distintas que escolheram opções de vida diferentes e ainda assim tinham limitações ao seu bem estar e equilíbrio. Também lhes faltava algo que a amiga Rachel coloca em perspectiva, quando escreve missivas em que lhes pede algo de estranho e complexo de executar, e tudo põe em risco. Meios de limpar a mente, concentrar energias e discernir o que era realmente importante.
Todas precisamos de uma amiga assim, que tenho o distanciamento e coragem suficiente para nos alertar para o que devemos mudar.

quinta-feira, 26 de julho de 2012

Ao encontro do nosso amor

Autor: Michael Baron
Edição: 2012, Abril
Páginas: 200
ISBN: 9789898228871
Editora: Quinta Essência

Sinopse:
A história de um amor imortal

Joseph, um homem à beira dos quarenta anos, acorda desorientado e constrangido num local que não reconhece. Parte numa viagem para encontrar a sua casa, sem saber para onde vai, orientado apenas pela visão preciosa e indelével da mulher que ama.
Antoinette é uma mulher de idade, que vive numa residência para séniores e que se refugiou no seu mundo interior. Aí, o corpo e a mente não a atraiçoaram. Aí, é uma jovem recém-casada com um marido que a idolatra e uma vida inteira de sonhos para viver. Aí, ela está verdadeiramente em casa.
Warren, filho de Antoinette, é um quarentão, anos que atravessa uma das fases mais difíceis da sua vida. Com tempo a mais, resolve tentar recriar as recordações de casa confeccionando os melhores pratos da mãe e saboreá-los com ela.
Joseph, Antoinette e Warren são três pessoas que andam à procura de casa, cada uma à sua maneira. No modo como se ligam umas às outras nesta fase crítica das suas vidas reside o fundamento do tipo de história profunda e comovente que nos habituámos a esperar de Michael Baron.

A minha opinião:
Desconcertante. As personagens para o leitor. Confusas, perdidas, sem memória como Joseph. Sem rumo como Warren após perder o emprego e no decorrer do processo de divórcio. Perdida no passado como Antoinette. 
Este pequeno, místico e terno romance fala de amor como elo entre as pessoas. Como a força motriz capaz de superar tudo ... o tempo e o espaço.

O autor inspirou-se naqueles raros casos que são exemplo de amor intemporal ou imortal como refere na capa. O amor dos romances mas que existe na vida real. O amor dos pais que sempre o fascinou. Um casal que formava um todo homogéneo, que quando um partiu, ficou um vazio impossível de preencher.
Através de Antoinette vislumbramos o pesadelo da doença de Alzheimer e apreciamos a dedicação e carinho de Warren ao tentar uma aproximação por cheiros e sabores, apelando às memórias dos muitos pratos que a mãe inventou. E também eu senti as papilas gustativas a salivar com as descrições dos pratos que Warren cozinhava para a mãe.
Que pratos suculentos e com divertidos e imaginativos nomes! Pratos dedicados a vizinhos, amigos e família.

Não é um livro memorável mas ainda assim é uma leitura agradável. As personagens são sucintamente abordadas porque o que interessa é o que as ligava. O amor entre eles.

segunda-feira, 23 de julho de 2012

Emmi e Leo - A sétima onda

Autor: Daniel Glattauer
Edição: 2012, Junho
Páginas: 240
ISBN: 9789720043078
Editora: Porto Editora

Sinopse:
«Pensas que não te vejo, que não te sinto. Engano. Puro engano. Quando te escrevo, seguro-te bem junto a mim.»

Emmi e Leo são os protagonistas de um amor virtual apaixonante, que passou por todo o tipo de emoções, menos a de um encontro físico. A relação, iniciada no irresistível Quando sopra o vento norte, parece ter chegado a um impasse. Leo decide partir para os EUA, renunciando a um amor impossível.
Quando regressa, longos meses depois, o encontro entre ambos concretiza-se. Mas Emmi continua casada e Leo tem em Pamela o amor estável com que sempre sonhara.Só que, na verdade, os dois amantes nunca estiveram mais apaixonados. Conseguirão eles, por fim, vencer o destino que parece teimar em separá-los?

A minha opinião:
Adorei ler Quando Sopra o Vento Norte e deliciei-me com esta refrescante "Sétima Onda". Que ansiedade me provocou a picardia entre Leo e Emmi que me fez ler este romance avidámente?!!!

Divertido, romântico e inovador, num jogo de palavras, ora espirituosas e provocatórias, ora audazes e inteligentes, ora carinhosas e carentes, num sentimento correspondido ... electrónicamente.
Desconhecidos que se cruzaram e descobriram, uma afinidade, empatia e entendimento tão grande que trespassou o seguro, o lógico e o racional e se tornou numa paixão avassaladora, que buscava a partilha e a compreensão. Uma paixão sofrida pelos impedimentos de ambos.

"Emmi, tenho de te confessar uma coisa, és a única mulher a quem escrevo, a quem escrevo desta forma, como sou, como quero. Na verdade és o meu diário, mas não ficas calada como um diário. Não és tão paciente. Intrometes-te sempre, retalias, contradizes-me, deixas-me desconcertado. És um diário com rosto, corpo e aparência."
(pag. 113)

Um amor possível e verossímel na Era da Informação/ Digital.

Numa linguagem simples, acessível e sintética, definimos e visualisamos os protagonistas, que o autor tão bem e distintamente caraterizou através de mensagens de email, e sofremos e torcemos pela união deles, apesar de todas as barreiras e dilemas.

"Porque te escrevo? Porque me apetece. E porque não quero esperar calada pela sétima onda. Sim,aqui conta-se a história da intransigente sétima onda. As primeiras seis são previsíveis e equilibradas. Elas necessitam umas das outras, formam-se umas sobre as outras, não trazem quaisquer surpresas. Mantêm a continuidade. Seis tentativas, tão diferentes ao vê-las de longe, seis tentativas - e sempre o mesmo objetivo.
Mas atenção à sétima onda! É imprevisível. Durante muito tempo é normal, desenrola-se numa sequência monótona, adapta-se à anterior. Mas por vezes rebenta. Sempre apenas ela, sempre apenas a sétima onda. Ela é despreocupada, inofensiva, rebelde, varre tudo e constrói tudo de novo. Para ela não há um antes, apenas um agora. Depois dela, tudo é diferente. Melhor ou pior? Só alguns podem julgar, aqueles que foram apanhados por ela, que tiveram a coragem de se entregar a ela e de se deixar enfeitiçar."
(pag. 160)

Eu fui apanhada por esta sétima onda, entreguei-me a ela. Deixei-me enfeitiçar nesta vertiginosa onda.

terça-feira, 17 de julho de 2012

A Mulher - Casa

Subtítulo: Cenas da Vida Intíma em Paris
Autor: Tânia Ganho
Edição: 2012, Maio
Páginas: 376
ISBN: 9789720045942
Editora: Porto Editora

Sinopse:
Ela é uma modista de chapéus pouco conhecida; ele, um ghostwriter de políticos menores e personalidades duvidosas. Quando trocam a pacata Aix-en-Provence pela imponente Paris, levam consigo toda uma bagagem de sonhos e promessas de glamour. Porém, o crescente sucesso profissional do marido depressa reduz Mara ao papel de mãe e dona de casa, arrastando-a para um abismo de solidão e desencanto.
É então que se envolve com Matthéo, um jovem chef mais novo do que ela, e de súbito se vê enredada numa espiral de sentimentos contraditórios onde a lealdade, a luxúria e o dever encerram as agonizantes perguntas: poderá uma adúltera ser uma boa mãe? Poderá ela esperar que este amor proibido a salve de si mesma e da sua falta de fé?

A minha opinião:
Muito gratificante  de cada vez que sou surpreendida com um novo autor que tão bem escreve em português. Que sabe contar uma estória. Que consegue caraterizar uma personagem como a Mara, com expressividade, intensidade e realismo. Parece-me que as percepções e emoções de Mara são próximas à autora. Também eu, e possivelmente muitas mulheres se identificam com algumas das facetas de personalidade de Mara, ou mesmo com as percepções, emoções e sentimentos em situações que ela experiencia. Esse entendimento, torna este romance uma leitura viciante.

O casamento e a maternidade em contramão com as expetativas, sonhos e ambições.
"O seu casamento é uma competição constante, um concurso com direito a um só vencedor. Talvez todos os casais sejam assim, mas ela sonha com uma relação em que duas pessoas fluam naturalmente para um mesmo objectivo, as ideias convirjam, as decisões se tomem em espontâneo unísono. Uma relação feita de silêncios e olhares cúmplices, economia de palavras, parcimónia de gestos inúteis."
(pag. 103)

"Mara sustêm a respiração sempre que a vê, fascinada com a pose e o equilíbrio perfeitos, a aparente descontracção, como se ser mãe fosse diferente para algumas pessoas, umas quantas eleitas que têm filhos que obedecem e não fazem birras e deixam que lhes ponham cintos de segurança e não se atiram das bicicletas para o chão. Filhos que comem, dormem, não se sujam, não gritam."
(pag. 236)

Esforço e exigência em crescendo, em prejuizo da autonomia e empenho na incipiente carreira criativa de Mara. Talvez a compreensão das circunstâncias seja deturpada, como a falta de carinho e apoio do marido que descreve workaholic e subserviente, mas é profundamente honesta e genuína no seu sentir.

"Às vezes, pensa com tristeza, o facto de duas pessoas se amarem não é suficiente para sustentar um casamento. É preciso simbiose: crescerem juntas no mesmo sentido, ao mesmo ritmo, terem metas comuns. Nesse momento, a única relação de simbiose que existe naquela casa é entre Thomas e o Ministro; Mara foi devorada algures pelo caminho, como plâncton."
(pag.251)
Eloquente. Melhor do que as minhas palavras, preferi  retirar fragmentos para ilustrar o meu parecer.

Numa linguagem rica, elaborada e "viva" de pormenores, a autora descreve e insere Paris na narrativa como se de outra personagem se tratasse. Uma personagem com um papel a desempenhar na narrativa.
Os meandros do poder e a hipocrisia e ilusão que corrompem os envolvidos. Tanto para absorver neste romance, que se torna uma leitura pausada e analitíca.

Um prazer de ler!!!

terça-feira, 10 de julho de 2012

As Coisas Que te Caem dos Olhos

Autor: Gabriele Picco
Edição: 2012, Abril
Páginas: 216
ISBN: 9789896660918
Editora: Contraponto

Sinopse:
Ennio é um jovem tímido que tem um interesse muito especial: lágrimas, misteriosas gotas de água salgada que contêm sonhos, lembranças, medos… Quando vê uma, fotografa-a e inventa uma história. Contudo, o próprio Ennio não chora, nunca. Aprendeu a enterrar a dor, a ocultar os sentimentos e, com eles, o seu segredo mais inconfessável.
Fugindo do passado, Ennio parte para Nova Iorque. Certo dia, encontra o diário de uma rapariga japonesa: Kazuko. Deslumbrado pelos fabulosos desenhos que encontra naquelas páginas, Ennio parte numa busca incessante para devolver o livro à dona. Durante este périplo, a sua história entrecruza-se com a de outras personagens tão excêntricas quanto cativantes: Gianny, que tem uma fisga no nome; Arwin, que filma tudo o que o rodeia com uma câmara escondida no cabelo; Josh, que perdeu a mulher no atentado às Torres Gémeas e agora coleciona pó; e, ainda, uma gaivota ferida, resgatada da neve de abril – que, dizem, dá sorte.
Uma fábula enternecedora com pequenas ilustrações do autor. Gabriele Picco também desenhou a capa, que na realidade foi uma escultura que fez.

A minha opinião:
Uma fábula urbana sobre o amor e a imaginação. Uma fábula ... porquê? Para mim, uma fábula é um género narrativo em que as personagens são animais, que personificam carateristicas humanas como a fala.

Conto Urbano.
Personagens com comportamentos errantes ou desconcertantes, em consequência de situações passadas, de medo, dor, perda, solidão, culpa. A linguagem utilizada é a dos afetos nesta imaginativa narrativa. Estados de espirito, emoções e sentimentos sobressaem e são "lidos" pelo coração e não pela mente.

Ennio é a principal personagem, estranha e intrigante, que virou costas a algo em Itália,  e nos dá a conhecer uma panóplia de outras personagens como o patrão Gianny, rude e em stress para sustentar um negócio de sucesso, e, com alguma ambiguidade moral; Arwin e a sua omnipresente Zelda que filma tudo de uma éfemera existência; Jessica -  pequena irmã de Arwin doente; Josh e o trauma presente da perda da mulher no 11 de Setembro, que compulsivamente colecciona pó; Victoria, rica e solitária que troca emails com o vizinho, até se envolverem; e finalmente Kazuko, a excêntrica artista, que esqueceu um diário de imagens/ "biblia", que apaixona Ennio.
Aparentemente nada liga estas personagens, mas na imensa Nova Iorque, cruzam-se e convivem estas existências marcadas por algum tipo de amor e perda.

Pequenos contos num conto maior que o autor com uma linguagem simples e até poética (e os desenhos de Kazuko), muita criatividade e fantasia, nos envolve e arrebata como crianças grandes na ambiguidades dos sentidos e sentimentos.

Gostei do "humor" e sentir recalcado que representa o homenzinho na barriga do Ennio. Ennio que nunca chora e coleciona fotos de lágrimas.

"Faz-me lembrar uma das centenas de fotografias que tirou às lágrimas de pessoas. Começou em menino, com a sua Polaroid, e, agora, fotografar essas pequenas gotas salgadas com a máquina digital tornou-se para ele uma espécie de obscessão. Está convencido de que nas lágrimas das pessoas se pode ler o seu passado. Até as recordações mais longínquas..."

(pag. 32)
Diferente e ... primeiro estranha-se e depois entranha-se. A ler!

domingo, 8 de julho de 2012

Alma Rebelde


Autor: Carla M. Soares
Edição: 2012, Abril
Páginas: 288
ISBN: 9789720043375
Editora: Porto Editora

Sinopse:
No calor das febres que incendeiam a Lisboa do século XIX, Joana, uma burguesa jovem e demasiado inteligente para o seu próprio bem, vê o destino traçado num trato comercial entre o pai e o patriarca de uma família nobre e sem meios.
Contrariada, Joana percorre os quilómetros até à nova casa, preparando-se para um futuro de obediências e nenhuma esperança.
Mas Santiago, o noivo, é em tudo diferente do que esperava. Pouco convencional, vivido e, acima de tudo, livre, depressa desarma Joana, com promessas de igualdade, respeito e até amor.
Numa atmosfera de sedução incontida e de aventuras desenham-se os alicerces de um amor imprevisto... Mas será Joana capaz de confiar neste companheiro inesperado e entregar-se à liberdade com que sempre sonhou? Ou esconderá o encanto de Santiago um perigo ainda maior?

A minha opinião:
Um romance de época encantador. Li este romance de uma "assentada" só. Não foi uma surpresa porque correspondeu exatamente ao que eu esperava e desejava ler.

Um romance aprazível e encantador que de ínicio narra os sentimentos de uma jovem angustiada, de familia abastada mas sem título ou brasão, que encarava o casamento como uma escravidão e sevícias. Um espírito livre que se revoltava contra tal destino, a que estava sujeita a sua prima Ester com quem se correspondia regularmente.

A "voz" de personagens secundárias como a Ester ou mesmo D. Ana (a mãe do noivo) surgem através de cartas que pautam esta narrativa. Pertinente e muito interessante, que em muito valoriza este romance.

Numa escrita simples e serena, Carla M. Soares, conta uma história de amor entre duas personagens que se comprometem num casamento arranjado pelas respetivas familias como estranhos, e em que mais não aspiravam do que uma pacífica e respeitosa união, sendo surpreendidos desde o primeiro momento pelas controversas personalidades e sentimentos.

Santiago é uma personagem que corresponde ao imaginário de qualquer mulher. Seduz a leitora.

Não sendo um bestseller, é na minha opinião direccionado para um público jovem e sonhador, que tem o mérito de nos dar a conhecer uma nova autora portuguesa e proporciona-nos ainda assim, uma leitura fluida e muito agradável, com personagens verossímeis e convincentes.

Suave e tranquilo, é certamente uma agradável leitura. 

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Fragmento

"- Pensar que umas gentes tão primitivas foram capazes de produzir algo tão extraordinário? - exclamou Hanna ao ver uma das ilustrações.
- A quem está a chamar "primitivo"? - replicou Ferguson.
- Os Chineses são os pais da pornografia; têm os mais antigos livros do mundo sobre o tema, que recua até ao ano 200 a.C. Aliás, os imperadores da dinastia Han chegavam a ser sepultados com as suas 'receitas de quarto' favoritas e com manuais de 'artes secretas'.
- Tudo para agradarem aos anjos! - exclamou Polly a rir.
- O Imperador Amarelo deitou-se com mil e duzentas esposas e concubinas, e subiu aos Céus com a alma pura - declarou orgulhosamente Ferguson, iniciando então uma palestra sobre as virtudes de se ter múltiplos parceiros amorosos ao longa da vida.- Ao deitar-se com muitas mulheres, o homem adquire uma reserva inesgotável de energia yin, que lhe prolonga a vida, lhe cura as doenças e lhe dá o poder de fazer um filho mesmo aos oitenta anos.
- E o que ganham as mulheres por se deitarem com muitos homens? - perguntou Linda Harris com uma expressão desaprovadora, embora fosse olhando de fugida para o livro ilustrado sobre a mesa.
- Sofrimento e seios descaidos, o que mais haveria de ser?! - sentenciou Polly, falando tão solenemente  como Ferguson, entre gargalhadas. - Para os homens é medicinal; para as mulheres é fatal."
(pag. 262)

quinta-feira, 5 de julho de 2012

O Português Inquieto

Autor: Kunal Basu
Edição: 2012, Abril
Páginas: 432
ISBN: 9789892318103
Editora: ASA

Sinopse:
Lisboa, 1898: António Maria, jovem médico e afamado playboy, descobre que o seu pai está a morrer de sífilis, a terrível praga que afecta todas as camadas da sociedade. Órfão de mãe desde criança, António não se conforma com a ideia de perder o pai tão cedo. Mas os seus conhecimentos médicos de nada servem neste caso. Determinado a encontrar a cura, parte para Pequim, na esperança de que a medicina tradicional chinesa tenha a resposta que teima em escapar ao Ocidente. Sob a orientação do Dr. Xu, António inicia-se naquela prática ancestral. Contudo, esta não vai ser a sua única revelação a Oriente. Quando conhece a sedutora e independente Fumi, ele apaixona-se pela primeira vez.
Mas à sua volta, a violência eclode. A Rebelião dos Boxers ameaça todos os estrangeiros a viver no país. António terá de decidir-se rapidamente entre a fuga e a permanência na China, a sua segurança pessoal e a possível cura para o pai. E há ainda Fumi, o amor a que ele não tenciona renunciar e que o leva a questionar tudo, alterando irreversivelmente o rumo da sua vida.

A minha opinião:
O título, a capa e a sinopse deixaram-me inquieta ... por o ler. Um livro que promete e cumpre como sendo uma boa leitura.

Depois de ler O Gosto Proibido do Gengibre, de que tanto gostei, estava entusiasmada com este romance histórico. Uma narrativa sobre as aventuras de um português que na viragem para o século XX, viaja para um lugar distante e exótico para encontrar a cura para uma doença vergonhosa e atroz - a sífilis. Muito pouco sabemos hoje em dia, quanto tanto se fala na Sida, sobre esta doença sexualmente transmissível, que vitimava prostitutas, marinheiros, soldados e camponeses. Mas as classes priveligiadas também eram vitimas desta tenebrosa doença.

"A sífilis ... manisfestava-se de forma diferente em cada vitima. Em alguns casos, mantinha-se adormecida por vários anos, enquanto noutros atacava com toda a violência mal apareciam as primeiras feridas nas partes privadas. Era tão comum encontrar a campa de uma vitima jovem, que mal chegara à flor da idade, como a de um idoso que vivera uma longa vida, mesmo com sífilis."
(pags. 249/250)

António é uma personagem boémia, galante e carismática, muito parecido com o seu pai, um respeitado e conceituado médico.  Dois homens solitários ligados por uma ausência.

"Desde que António compreendera a irrevogável trajetória da caixa em que a sua mãe fora colocada, formara-se entre ele e o pai uma camaradagem silenciosa, fundada no imaginar do que poderia ter sido se ela ainda fosse viva."
(pag.19)

Uma narrativa colorida, pautada por descrições repletas de sons, cheiros e odores marcantes e distintos, personagens misteriosas e enigmáticas, diferentes e inspiradas, que nos transportam para um tempo e um lugar em conflito. Conflitos culturais e sociais numa espiral de violência e morte, onde António se apaixona por Fumi. Um amor obsessivo.

Um prazer de ler!